Vez ou outra, o diretor Neil Jordan é atacado pela crítica quando engata em um filme comercial. É bem verdade que ele é um diretor intimista que se perde ao tentar vôos mais altos, mas seus filmes comerciais têm o que falta em uma porrada de grandes produções: honestidade. Meu filme preferido do diretor, ironicamente foi o último a que assisti, The Crying Games, e eu até tenho certo carinho por algumas de suas obras esculachadas como Lance de Sorte e Entrevista Com o Vampiro.
Valente, o trabalho anterior, é sua grande bola fora e Ondine veio para corrigir isso. Ao narrar a história de um pescador (Syracuse, Colin Farrel) que pesca uma mulher misteriosa e acaba por acreditar ela ser fruto de sua imaginação, Jordan alcança remição. A filha do protagonista, que sofre de insuficiência renal, acredita que a moça é uma Selkie; criatura aquática meio foca, meio mulher; que é fruto da mitologia irlandesa/escocesa. A vida do cara dá uma sacudida, vida essa nada fácil como de costume nos personagens de Jordan. Essa novidade ao mesmo tempo que lhe traz um renovo, lhe embaralha as idéias. Há 2 anos está longe do alcoolismo, ainda tem que aturar um passado de perdas sofridas.
Mais uma vez a paixão do diretor pela água fala mais alto. Muita água permeia o longa com ares de contos de fada (deixa A Dama na Água de Shyamalan no chinelo). Há citações interessantes de A Branca de Neve e Alice no País das Maravilhas, fazendo tudo se intrincar. Rodado nas paisagens estonteantes e frias da Irlanda (fotografia colírio de Christopher Doyle), terra natal de Jordan, o roteiro escrito por ele próprio se perde um pouco na dissolução do mistério no fim do filme, mas nada que apague o brilho do mesmo.
Assim como no balé de três atos do The Royal Ballet; Ondine, o filme; anda lado a lado com a trilha sonora. Quando Frederick Ashton adaptou o conto mitológico para a dança, em 1958 chamou Hans Werner que compôs uma trilha que é considerada moderna até hoje. Neil Jordan chamou Kjartan Sveinsson e o resultado é plenamente satisfatório. Achei fantástica. Tanto o balé quanto o filme são inspirados no romance "Undine" de Friedrich de La Motte Fouqué. E como não se pode deixar de elogiar as irretocáveis perfomances de todo o elenco, Colin Farrel, que não fica bem de cabelos grandes, foi a escolha certa, com seu sotaque carregadíssimo, para transformar este filme em uma boa surpresa.
No fim, depois de citações literárias de contos fadas, simbologias, muita água e mistério, tem-se o toque de Jordan, que soa brilhante, mas furado (eu escolhi engolir seco). O filme ainda não estreou no Brasil e a Imagem filmes não tem data prevista.
» Avaliação: 8.0
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